Por Michele Calliari Marchese
Esse causo é muito verídico
e até hoje acontece de tempos em tempos, mas naquela época era uma coisa muito
sensacional e deveras assustadora.
O Fioravante tinha um bonito
pedaço de terra, grande até, em que ele plantava de tudo e que o tinha deixado
rico. Estava na safra de milho e várias vezes o homem fora visto com lágrimas
nos olhos a contemplar a plantação.
O milho crescia
maravilhosamente bem e o clima estava ajudando, seria uma das melhores
colheitas na Campina e o preço da bolsa fazia com que o Fioravante cogitasse em
comprar um Dodge D11, lindo de morrer.
Aconteceu que num
entardecer, o Fioravante saiu da plantação mandando beijos ao vento para que o
milho sentisse a sua presença de amor, despedindo-se até o dia seguinte que
seria o dia em que ele passaria algum produto para fortalecer as plantas.
No dia seguinte lá foi o
Fioravante com seus funcionários para a lavoura e o que encontraram
deixaram-nos muito desconfiados. Muitos pés de milho estavam deitados como se tivessem
sido empurrados ao chão com tal força que não era possível eles voltarem ao
normal. Constataram que havia um imenso desenho ali, pois foram percorrendo por
cima do milho e fizeram um círculo perfeito. Indo ao centro do círculo havia
outro tanto de carreiro de milhos em pé e depois novamente uma grande área de
plantas deitadas. Teriam que ver de cima para entender a extensão da coisa.
Subiram num morro longe da
área plantada e que Fioravante calculava que daria para ver se não todo, pelo
menos parcialmente o que estava acontecendo. Chegaram lá no dia seguinte depois
de praticamente abrir a mata à facão e viram vários desenhos de tamanho
descomunal, lindos, perfeitos. Mão alguma faria aquilo daquele jeito e em tão
pouco tempo.
Extasiado com a situação e
diante de tal espetáculo, ele nem se deu conta que os peões já tinham
abandonado o local e provavelmente a comunidade inteira estava sabendo do
ocorrido, pois que o vizinho já estava lá embaixo pisando no milho deitado com
as mãos na boca. Gritava alucinado esse vizinho e então não sobrou alternativa
ao Fioravante a não ser ficar por ali e pensar no assunto.
A primeira coisa que pensou
foi que o Dodge ficaria para o ano seguinte, se nada mais acontecesse na sua
lavoura. Tentou conciliar o sono com o acontecido, mas a balbúrdia era tão
grande na plantação que passou a noite em claro.
O acontecido durou mais de
uma semana, pois que vinham gentes de todos os lugares. Pisavam em tudo e em
pouco tempo não sobrou lavoura de milho em pé para contar a história e para
comprar o tão sonhado carro.
Era uma desolação. Aquilo
fustigava os nervos do Fioravante até que finalmente se decidiu por um fim em
tudo. Pensou duas vezes antes de despejar o conteúdo de um lampião no centro do
círculo. Andou para lá e para cá e mediu a passos miúdos o desenho central e
lá, exatamente lá, iniciou o fogo destruidor.
Mas aconteceu que o fogo não
se alastrava e tampouco diminuía, ficava ardendo em chamas - as mesmas chamas -
por um tempo que não soube precisar e pensou que talvez aquela não pudesse ter
sido uma boa ideia e foi quando ele começou a pisotear o fogo para apagá-lo que
apareceu em cima de sua cabeça e por toda a extensão do círculo uma sombra
assustadora. Sem mais, nem menos. Achava que eram nuvens de chuva, mas aí
perpassou um frio pela espinha do homem quando levantou a cabeça e deu de olhos
num disco voador.
E o Fioravante não se
lembrava de mais nada depois disso. Quando levantou, porque estava deitado no
centro do círculo, ficou embasbacado ao constatar que as espigas estavam secas
e prontas para a colheita e mais lindas do que antes.
Colheu tudo sozinho numa
pressa de louco, primeiro porque os peões abandonaram a lida e segundo porque
poderia chover se se atrasasse.
Não pensou mais em círculos,
em fogo e em discos voadores, a quantidade de milho que colheu foi o dobro do
que esperava e agora toda a comunidade vinha ver quão prolífica tinha ficado a
lavoura depois do círculo misterioso e trataram de pedir ao Padre que o
excomungasse, pois que era sem sombra de dúvidas obra do coisa-ruim.
O Fioravante aceitou a
excomunhão com um sorriso nos lábios e os olhos espichados no Dodge D-11 que o
esperava na estrada.
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