Por Michele Calliari Marchese
Esse causo aconteceu quando
o Firmino ainda era menino de seus 14 anos, e fez um rebuliço danado por causo
de um sonho que teve. Saiu gritando porta afora, seguido de sua prestimosa mãe
que tentava a todo custo calar-lhe a boca. Chorou e gritou tanto que o povo da
Campina da Cascavel se aglomerou em volta do rapaz a perguntar-lhe o que havia
acontecido, e o Firmino com voz chorosa disse que tinha sonhado com um andor,
carregado por seis pessoas que tinham a catástrofe em seus olhos e mais seis
visionários.
Algumas mulheres que estavam
por ali se olharam assustadas e o Padre Dimas fazia o sinal da cruz de cabeça
baixa e muito preocupado.
Firmino contou mais, contou
que não conhecia a santa que seguia em cima do andor e que carregava um manto
envolto na cabeça com uma frase que lhe pegava de um lado ao outro e que dizia:
“O fim do mundo está próximo”. E quando terminou de lembrar sobre essas
palavras apocalípticas, voltou a chorar com todas as suas forças.
A grande maioria das pessoas
que estavam em volta de Firmino, começou a caminhar lentamente em passinhos
silenciosos e febris em direção à Igreja e levaram o rapaz que, sem saber como
e nem por que, encontrava-se dentro do átrio com o Padre Dimas a encabeçar a
turba. Logo, todos se sentaram e Firmino continuou em pé.
Tinha que dizer algo, porque
as pessoas que estavam ali careciam de respostas. Virou a cabeça e olhou todas
as pessoas e então ele se arrependeu amargamente de ter contado o sonho e num
relance viu as proporções que seu rompante havia atingido. Agora era tarde
demais e viu o olhar de sua mãe, num canto da capela a auscultar-lhe o coração,
infligindo mais culpa ainda em sua pobre alma assustada.
Fechou os olhos e começou a
rememorar o sonho. Contou de novo e com mais detalhes sobre o andor e sua
santa, contou sobre as doze pessoas que o carregavam e seus olhos assustadores.
Contou sobre o manto. E lembrou que também estava escrito alguma coisa a mais e
que não era no manto, mas que estava em algum outro lugar por ali, como se fosse
uma data.
A data para o fim do mundo?
O Padre Dimas que tinha a
cabeça baixa a escutar o rapaz, levantou de sobressalto e procurou fazer com
que Firmino não continuasse em suas premonições, pois que aconteceria outra
catástrofe, e pior que aquela que estava sendo anunciada.
Mas a população curiosa e
interesseira não permitiu que o Firmino saísse de lá sem dizer quando, onde e
por que. Até o Padre em seu íntimo tinha uma vontade incontrolável de saber
quando aconteceria o fim do mundo. Só a mãe do rapaz que saiu da igreja sem
mais nem menos, porque não queria saber de nada, porque queria seu filho de
volta em casa, são e salvo e sabia também que dependendo do que ele
responderia, poderia ficar com uma fama para o bem ou para o mal para o resto
da vida e sofreria decerto com as muitas maledicências.
Mas o Firmino não arredou pé
da igreja, nem quando a mãe num gesto muito rápido pediu a ele que fosse junto
com ela para casa. E ele continuou com seu sonho premonitório dizendo a uma
população assustada que naquele dia fatídico, aquele do fim do mundo, todos
saberiam quando seria porque seria o dia em que todos reconheceriam de peito
aberto a morte, escutaríamos as estrelas suspirando, a Lua dando cria e um
portal de luz sendo aberto para visitarmos nossos outros eus em outras esferas.
E que no dia vinte e um de dezembro de 2012 aconteceria tudo isso e todo mundo
saberia em seu íntimo todos os segredos do céu e da terra e conheceria
finalmente o Criador, que vinha pilotando uma máquina voadora gigantesca para nos
dizer coisas sobre a água. E Firmino não parou mais.
Não se soube se foi o verbo
empregado no discurso, ou se pelos absurdos de outros “eus”, mas o fato é que
Firmino ficou sozinho na igreja.
Ele não foi taxado de nada
como sua mãe tinha suspeitado muito pelo contrário, elogiavam a criatividade do
garoto e pediam vez ou outra se ele tinha mais histórias a contar. E Firmino
seguiu a sua vida sem esquecer nunca do sonho que tivera.
Hoje, com 96 anos conta os
dias com um frenesi de louco porque todos os que escutaram seu relato há 82
anos estão mortos.
E espera sozinho o fim do
mundo, porque todas as noites ele escuta as estrelas suspirando e isso o
irrita.
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Adorei Michele, ate consegui imaginar o Firmino olhando para dentro dos seus sonho e criando, criando detalhes. As vezes faco isso ao acordar de um sonho que nao terminou, fico criando finais (sempre felizes, claro) ate dormir de novo. As vezes ate consigo voltar ao mesmo sonho, mas nunca termina como eu queria.
ResponderExcluirQuerida amiga! Fico muito feliz que esteja acompanhando os contos dessa sua amiga daqui da Campina! Beijos nessa família linda!
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