Por Michele Calliari Marchese
Esse
causo aconteceu na Campina da Cascavel e há sérias dúvidas de que tenha
realmente acontecido, mas aconteceu. Foi há muito tempo, tanto tempo que não se
sabe precisar, mas foi na época em que o Padre Dimas estava começando seus
serviços religiosos por aqui.
Conta-se
que numa noite de céu estrelado, a Dona Jovilde, junto com o seu marido Alencar
viram chegar à Campina um cavaleiro muito estranho. Vinha montado num cavalo
branco e trazia consigo um arco, mas que não puderam ver direito do que se
tratava, já que estava escuro. O cavaleiro estacou de súbito em frente ao casal
e disse numa voz de barítono: “Venho para vencer e quem quiser que venha
comigo.” E assim como apareceu, deu a meia volta e retornou de onde estava
vindo. A Jovilde e o marido acharam tratar-se de algum louco e continuaram seu
passeio alegremente.
Justamente
nesse horário da aparição, o Padre Dimas acordou sobressaltado com um sonho que
teve a respeito da vinda do tinhoso.
Sonhou
que o próprio credo em cruz arrebataria as almas da Campina num estalar de
dedos e ainda se riria do pobre Padre Dimas.
Não
se sabe o que pesou mais; se o medo do tinhoso ou se o orgulho ferido, mas a
verdade é que na Missa de domingo o Padre convocou toda a população para uma
nova novena para que as almas não se perdessem e não caíssem na conversa do
demo se por uma desventura ele aparecesse.
Ele
não apareceu, o Padre deu-se por satisfeito e com o orgulho restituído.
Na
semana seguinte a Dona Silvana e as crianças, viram um cavalo vermelho aparecer
na Campina. Conta ela que o cavaleiro tinha uma espada na mão, do tipo que
jagunço usa e imediatamente mandou o filho mais velho chamar o delegado e ficou tão desconfiada que não escutara as
palavras ditas pelo cavaleiro e tampouco vira quando desapareceu. Deu-se conta
da gravidade da situação quando chegou o Padre Dimas suando em bicas dizendo
estar se sentindo muito mal a ponto de desmaiar. “Deve ser o calor, seu padre.”
Disse a Dona Silvana de olho no delegado que chegava ao seu encontro.
Mas a
Dona Silvana não pôde contar nada porque aconteceu de chegaram subitamente na
Campina mais de 350 jagunços fugidos da Guerra dos Pelados e corriam feitos
loucos em seus cavalos pela estrada, levantando pó e trazendo muito desespero.
O padre ajoelhou-se ali mesmo, seguido de delegado, da Dona Silvana e das
crianças e começaram a rezar e só pararam quando a Campina ficou num silêncio
de morte.
“Foi
exatamente isso que eu sonhei”. Disse o Padre Dimas já refeito do susto. Com
surpresa constatou que não houve gentes feridas, como também, a população
incrédula não sabia do que eles estavam falando. Benzeram-se e foram embora
psicologicamente abalados.
Na
terceira semana, numa manhã de quarta-feira foi o barbeiro que, abrindo a porta
da barbearia deu de cara com um cavaleiro segurando uma balança montado num
cavalo negro.
Perguntou
se podia ajudá-lo e percebeu no seu íntimo que seus preços de corte de cabelo e
barba eram muito baixos e injustos e certa indignidade tomou conta de si. Ele não
notou quando o cavaleiro foi embora devido a que todo o povo da Campina estava
a reclamar de fome e de injustiças.
Teve
que ter uma intervenção do Padre Dimas, que, segundo ele, havia também sonhado
com a fome assolando a Campina, mas, ao contrário das reclamações e do sonho
premonitório, ali abundava o alimento e tudo o que se plantava era colhido com
sucesso. Fez as pessoas verem que tudo não passava de um grande embuste
proclamado pelos Cavaleiros do Apocalipse e então as pessoas se deram conta das
injúrias que tinham cometido e tentaram e conseguiram esquecer o ocorrido.
Agora
restava esperar o quarto e último cavaleiro – o da morte - que apareceu na
semana seguinte para o Padre. Vinha o cavaleiro segurando uma jarra e seu
cavalo tinha uma cor pálida, como a de um cadáver que se decompõe, muito
esquálido e quase a cair.
O
cavaleiro ofereceu a jarra ao Padre Dimas e então todo o inferno apareceu
diante de seus olhos. Tudo ficou escuro e mau; o Padre Dimas teve muita
dificuldade em refugar o presente mortal que lhe era oferecido, mas com a força
do seu orgulho conseguiu segurar, diante de seu coração, uma cruz benta e ali
ficou de olhos fechados, tremendo inteiro, rezando rezas sem nexo e pedindo que a morte fosse embora da Campina.
Sentiu
uma lufada de vento quente em seu rosto, abriu os olhos e viu o sol brilhando
naquele dia primaveril.
A
vida retornava à Campina da Cascavel e a única coisa que a população não
conseguia entender é: como é que estavam no mês de outubro se não tinham vivido
o mês de setembro. Poucos velhos sabiam desse episódio, mas preferiram nunca
comentar.
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Um conto assombroso!!! Muito boa a narrativa. Prende a atenção, desperta a curiosidade e culmina em um final misterioso (desses que eu gosto).
ResponderExcluirBom dia, Helena. Parabéns ao talento da autora.
Oi Ana! Assombroso não? É que você não vive aqui na gloriosa Campina da Cascavel.... coisas muito mais assombrosas assolam os animos que qualquer vivente! Bom saber que gostou, venha sempre, um beijo! Michele C.Marchese
ExcluirÉ muito agradável ler contos da natureza, com suspense. Uma ótima escolha para a postagem. Bjs.
ResponderExcluirMarilene, muito obrigada pela leitura! Beijos
ExcluirMichele C.Marchese
OI HELENA!
ResponderExcluirCHEGUEI AQUI, LI O CONTO QUE É DE DAR MEDO E FIQUEI.
ESTOU TE SEGUINDO.
ABRÇS
http://zilanicelia.blogspot.com.br/
Obrigada Zilani, fique mesmo!!!! Beijos
ExcluirMichele C.Marchese