Por Heitor Herculano Dias
Conto integrante de ACONTECE TODOS OS DIAS (publicado na Amazon)
Rua transversal à Avenida Paris, Bonsucesso. Vinte e uma horas e trinta e
cinco minutos. A velha kombi acaba de estacionar em frente a uma banca de
jornais, fechada a estas horas. Desembarcam do veículo Pestinha Um e Pestinha
Dois, enquanto Pestinha Três prefere ficar ao volante queimando pedra.
A cinco metros adiante, Shung-Su e sua mulher Mi-Su se preparam para
encerrar o movimento do dia da Pastelaria Oriente.
Ele, de tamancos, camiseta e calças arregaçadas até a metade das canelas,
esfrega o piso de ladrilhos cinza e negro com um pano úmido preso a um rodo.
Ela, por trás do balcão de alumínio, arruma em duas caixas de plástico os
instrumentos de corte e amassamento da massa de pastéis.
— Três pastel de queijo e três caldo, mano — mais ordena do que pede
Pestinha Dois, que entra meio curvado sob a porta metálica do estabelecimento
comercial, arriada quase até a metade.
Shung-Su olha para ele, descansa a palma das mãos na ponta do cabo do rodo,
e fala.
— Za feçado.
Mi-Su pára de mexer com os talheres de fazer pastel e olha alternadamente
para Pestinha Dois e Shung-Su.
Pestinha Um acaba de entrar também.
— Que qui foi? — é Pestinha Um quem quer saber.
— Pastel e caldo, amizade! Vô pagá, porra! — Pestinha Dois fala alto.
— Feçado. Pastelalia feçado za — diz em voz sumida Shung-Su, sua redonda
face oriental transtornada diante do que sabe ser agora inevitável.
Mi-Su é o medo recortado contra um fundo azul e amarelo de azulejos
brilhantes.
— Fechado o caralho, chinês filho-da-puta! — a agressão verbal é
concomitante à agressão física feita pelo disparo da arma de Pestinha Um.
Mi-Su não grita, não move um músculo, um nervo sequer.
Colada na fria parede, tem medo até de chorar.
Shung-Su caiu com a leveza de um mandarim de subúrbio, o cabo do rodo
cruzado sobre o peito como um cetro vagabundo.
Nota: Assumimos que este texto trata-se de ficção, ou seja: assemelha-se à realidade mas não se refere concretamente a pessoas e/ou fatos da vida real. Ele nos foi enviado para publicação pelo(a) próprio(a) autor(a), sendo aqui reproduzido conforme o original recebido, sem alterações. É de autoria e inteira responsabilidade do(a) autor(a), que detém sobre o mesmo todos os direitos autorais. Este texto não representa, necessariamente, a opinião das editoras e de outros autores deste site.
© 2014 Blog Sem Vergonha de Contar - Todos os direitos reservados. Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.
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Obrigado, caras Helena e Michele, pela publicacao. Retifico o nome do livro onde este episodio estah inserido, pois o mudei para ACONTECE TODOS OS DIAS, publicado pela Amazon. Abracos.
ResponderExcluirEu que agradeço, Heitor, você ter prestigiado o nosso blog enviando-nos outro de seus contos, indiscutivelmente bons pois sempre nos levam à confrontação com uma dura realidade, o que eu acho muito válido e necessário. Gostaria de oferecer aos nossos convidados a atenção de um público maior, mas quanto a isso, a única coisa que podemos fazer é deixar a sementinha nos hectares da rede e esperar que dê algum fruto no futuro, em algum lugar. Vamos seguindo então, pois há tempo para tudo: tempo de semear e tempo de colher. Um abraço e sinta-se sempre convidado a participar outras vezes. Sucesso, tudo de bom!
ResponderExcluirObrigado, cara Helena, por suas gentis palavras. Saiba que, sendo meus trabalhos recebidos com tantos elogios neste admiravel blog, sinto-me no tempo de colher e a um so tempo incentivado a seguir semeando. Abracos.
ExcluirEsse pequeno conto, possui um grande impacto, um choque até. muito bom. Além de possuir, uma verdadeira, realidade.
ResponderExcluirAbraço,Heitor Herculano Dias.