Por Meriam Lazaro
O tempo quando quer, corre mais que coelho. Não era o caso agora, em que lhe faltavam horas, dias, meses e os ponteiros permaneciam parados. Na antessala, imaginava o paraíso. Lis seria o seu nome!... Ganharia canção de ninar trazida por um pássaro. A ave negra abriria as asas se transformando em uma esfera azul dançante. Como quem invoca a proteção dos quatro elementos, a ave soltaria cada trinado mais belo que o outro, atraindo as bênçãos celestiais: fecundidade, elegância, pureza! Depois viriam as ninfas do velho arroio dilúvio para acrescentar: beleza, atração, perfume! Que mais poderia querer uma futura e orgulhosa mãezinha? E não é que houve a intromissão dos seres da floresta que exigiram pagamento em troca daquelas qualidades?! Para gozar de fecundidade e beleza, sua pequena Lis deveria passar pela dor; em nome da elegância e atração lhe seria exigido sacrifício; pela pureza e perfume teria que lidar com a incerteza do destino. Quem iria querer ver a luz de um mundo assim? Antes que o espírito do fogo se manifestasse, decidiu apelar: — Vocês, que vieram do início da evolução do homem, poderiam anular a dor, o sacrifício e a incerteza profetizados pelos gnomos? Labaredas do tamanho de uma árvore se manifestaram: — Sim. Mas para não sofrer há somente um meio, se você concordar. — Faço qualquer coisa! Atalhou a mulher, já sem dor alguma. Com estrondo de trovão, a Salamandra bradou: — Digo-lhe então que sua flor não morrerá jamais! A eternidade se precipitou... No hospital, o médico recomendou à enfermeira que despertasse a paciente da anestesia. Antes da volta para casa, seus pais haviam se desfeito do berço, enxoval, brinquedos e tudo mais que pudesse despertar na filha a tristeza pelos sonhos perdidos. Esquecido num canto do teto, um móbile zombava desse cuidado. Feito de plástico, pequenas flores-de-lis giravam e giravam embaladas pela canção dos Titãs: “A dor vai fechar esses cortes. Flores. Flores. As flores de plástico não morrem”.
Nota: Assumimos que este texto se trata de ficção, ou seja: não se refere a pessoas e fatos do mundo real nem emite sobre eles juízo ou opinião. Ele nos foi enviado para publicação pelo(a) próprio(a) autor(a), sendo aqui reproduzido conforme o original recebido. É de autoria e inteira responsabilidade do(a) autor(a), que detém sobre o mesmo todos os direitos autorais. Este texto não representa, necessariamente, a opinião das editoras e de outros autores deste site.
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Li várias vezes, e senti poesia no texto, mas preciso confessar: não o compreendi...
ResponderExcluirCerta vez eu pensei na morte como um estado de congelamento. Sim, as flores de plástico não morrem, quem dera as pessoas fossem de 'plástico' também, mas só neste sentido, o de permanecer vivas entre nós.
ResponderExcluirReproduzo aqui os comentários da Meriam, os quais ela não conseguiu deixar aqui por um problema da plataforma:
ResponderExcluir"Grata, Ana, pela sinceridade. Admiro você ainda mais pela palavra autêntica. Na verdade, há contos que após a leitura nos deixam com cara de bestas. Não era a minha intenção nesse. O tempo da história (de um exercício em grupo) está marcado pelas reticências. Abraço. Meriam
Querida Helena, grata por ter aceitado de imediato o texto para publicação. Seu trabalho de formiguinha pelos escritores amadores, como eu, é a "pequena coisa com grande amor" de que falava Madre Teresa. Abraço. Meriam"
Meriam! Também sempre tive em meu pensamento que as flores de plástico e a morte são uma coisa só, não sei se é pela cultura de colocar flores de plástico em túmulos ou o que, só sei que também escrevi algo sobre as flores de plástico relacionadas com as perdas. Gostei muito do seu conto! Apareça sempre querida!
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