segunda-feira, 9 de setembro de 2013

A Missa de Sétimo Dia



Por Michele Calliari Marchese

Esse causo começou numa tarde, quando apareceu na igreja uma mulher muito desconhecida do povo da Campina. Vinha com os pés descalços e muito machucados da caminhada, as roupas eram puídas, escuras e rasgadas, carregava um saco velho e aparentemente vazio.
Ela tinha o aspecto de uma mulher muito sofrida, seus cabelos presos num coque atrás da cabeça eram um emaranhado sombrio de fios brancos e pretos.
Vinha de longe e tinha que falar com o Padre Dimas.
Era uma quinta-feira, dia cinco de fevereiro e a mulher precisava que o Padre rezasse uma missa.
Uma Missa de Sétimo Dia pela morte do marido acontecida há seis dias, numa emboscada de mato em que ela foi a única sobrevivente. O nome do marido era Darci e antes que fosse curar das feridas, precisava mandar rezar a Missa.
O Padre vendo o estado lastimável em que a viúva se encontrava, procurou saber de onde vinha e se tinha parentes na Campina; e qual o seu nome. “Emma” disse a mulher, “sou de uma terra perto de Palmas, mas para lá eu não volto nunca mais”.
A mulher saiu dizendo que iria curar as feridas e não foi mais vista pelo Padre nem na Missa de Sétimo Dia. O Padre ficou preocupado. A mulher poderia ter morrido em qualquer canto devido aos ferimentos que tinha e mandou alguns meninos procurarem por uma mulher de nome Emma em estado doentio.
As crianças voltaram com os pais delas, que juraram não encontrar ninguém conforme que o Padre tinha pedido e logo todo o povo estava sabendo da dita mulher e de seu marido morto em tocaia.
Algum tempo depois quando foi o dia cinco de agosto, numa quinta-feira também, apareceu de novo a Emma, em lamentável estado de saúde, implorando ao padre que rezasse a Missa de Sétimo Dia para o marido Darci que tinha acontecido seis dias antes.
O Padre desconfiou.
Quando se virou para mandá-la entrar, ela tinha sumido das vistas dele e não deu tempo sequer de pedir como estava.
O Padre se assustou.
Chamou o delegado e explicou tudo o que tinha acontecido e mandou que enviasse a polícia para o mato e verificar a procedência das informações para que se pudesse agir em favor da viúva e prender os jagunços que mataram o marido Darci.
O delegado enviou telegramas às comarcas vizinhas para saber de alguma pista do ocorrido e não teve resposta até o dia 05 de maio do ano seguinte, quando Emma voltou para a Campina exigindo que um Padre Dimas apavorado lhe rezasse a Missa de Sétimo Dia para o marido morto. E o Padre recobrou a presença de espírito e pediu-lhe que só com o sobrenome era possível que a Missa se realizasse ao que ela lhe respondeu: “Felipetti”.
E sumiu de novo.
O Padre ajoelhou-se e acendeu algumas velas. Não era possível que essas coisas misteriosas e sem explicação acontecessem só na Campina. Nunca tinha ouvido essas coisas dos outros padres da região. Era só ali que acontecia. Acendeu mais algumas velas.
Marcou no calendário que a próxima visita da viúva aconteceria somente em janeiro do próximo ano. Dia cinco, numa quinta-feira. Até lá teriam tempo de sobra para descobrirem o paradeiro da coitada.
Depois de passar o sobrenome para o delegado, as buscas surtiram efeito através da polícia de Clevelândia, no Paraná, que mandou um telégrafo solicitando a presença do delegado e do Padre Dimas, que foram até lá ouvir o relato do Inspetor da Polícia.
Ouviram tudo muito calados, muito abalados e o Padre não parava de se benzer e benzer o delegado.
“Houve uma conversa de que havia ouro enterrado nas terras do Darci. Ele cavou e quando levantou a cabeça para mostrar para a esposa o saco cheio de ouro, ela segurou o saco e matou o coitado com um pedaço de pau e quando puxou o homem para fora ela se desequilibrou e caiu, morrendo também. Quem viu tudo foi um vizinho que ficou interessado na escavação e foi lá ajudar o Darci. Quando viu a Emma atacar o coitado ele se escondeu. Saiu correndo, mandou chamar a polícia e deu esse depoimento. Nunca encontraram o ouro.”
O Padre pediu com todas as forças de seu pensamento: “Quando foi isso seu Inspetor?”
“Foi no dia cinco de janeiro de 1.899, numa quinta-feira.”
No dia cinco de janeiro do ano seguinte, aquele marcado no calendário da Paróquia, o Padre chamou a comunidade inteira para participar da Missa de Sétimo Dia de Emma para que enfim ela descansasse em paz.




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2 comentários:

  1. História de arrepiar, não é mesmo? Há mesmo mais coisas entre o céu e a terra do que imaginamos... Ainda bem que eu moro em CampinaS e não em Campina assim não passo medo! Parabéns, Michele, pelo causo.

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    1. Oi Lu! Obrigada pelo comentário. "Campina da Cascavel" é uma tradução da língua kaigangue para Xanxerê. E olha, essas coisas acontecem mesmo! Beijão

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